sábado, 30 de julho de 2016

sexta-feira, 29 de julho de 2016

Sopro

Se porventura morresse hoje neste agora 
Que soubesses que aquele teu olhar sob 
Os teus cabelos voantes minha mortalha.



(c) Filipe M. | texto e fotografia (2016)

quarta-feira, 27 de julho de 2016

Inquietações

Até uma determinada altura, pude
Exactamente o quê não sei bem e
Não sei bem exactamente o que 
Deixei de poder. Enfim, bem sei 
Que um fato não é peça única 
E que é o anonimato da linha 
Que cose as partes que lhe 
Dão aquela junta aparência 
E quando saímos da linha lá 
Se vai a compostura; vai daí 
Andamos aos papéis, porque
Precisamente sem nenhum! E 
Ainda que entre o que pude e 
O que não posso agora, possa
Haver uma distância ínfima que 
Caiba na cabeça menor e maior
Que seja é ainda assim abissal o
Transtorno. Transtorno porque se 
Interrompe a marcha e transtorno 
Porque deixamos de perceber seu 
Sentido; isto é: porque a fazemos e 
Um clássico o donde e o para onde! 
Quando deixamos de poder espanta 
Como pudemos. Se houver por acaso 
Retoma a perplexidade ganha sentido 
Inverso: como pudemos ser incapazes
Quando já tão capazes somos. Questão: 
Ainda que saiba as somas destas razões 
Que conduziram àquele ser incapaz disto 
E daquilo falhamos sempre o minuto zero! 
Mais que tudo é essa imprecisão do tempo 
E do teor: a dupla indeterminação frustante. 
Porque fomos capazes e depois incapazes!?
Em que preciso momento uma coisa e outra?



(c) Filipe M. | texto e fotografia (2016)

terça-feira, 26 de julho de 2016

Rua da Rosa

A rosa rua 
É tua boca
P(rosa) nua
Rua da rosa 
Rosa rosário
Pétala, pedra
Rosa nome de
Flor Rua d'amor.


(c) Filipe M. | texto e fotografia (2016)

segunda-feira, 25 de julho de 2016

A fronteira ténue

Naquele sítio onde havia gente soube hoje
Da minha morte! Só foi inesperada porque
De há muito por mim esperada. Boa gente 
Mo disse Cedo dei inicio àqueles preparos. 
Nunca sucedera sofrê-la tão pronunciada, 
Tão afirmativa. A força da coisa impôs-se, 
Dissipando qualquer lirismo ou deslocado 
Sentimentalismo Formalidades mundanas 
Tomam a primazia. O além tem alfândega.
Exéquias sóbrias, necessárias ao consolo
De quem fica em nome de quem parte. À 
Parte uma ou outra lágrima foi escorreito 
E contido o magro cerimonial conforme à 
Sua vontade e amigos de sempre põem o 
Contra-campo do anedotário logo em dia.
Sabes que não há repentes nestes casos; 
Há insinuações, murmúrios preparatórios, 
Que se lidos a tempo maduram a estação, 
Amortecem a queda com sorte talvez até, 
Travada por mão amiga. Mas o descaso é 
Cegueira atontada; o pensamento mágico 
Os seus resquícios trazemos à infância do 
mundo. Nessa ilusão nem damos conta de 
Que se altera a condição Estar morto pode 
Ser de ténue percepção estranha-se muito 
Pouco o novo estado nada mais do que isso. 
Quem era depois? O que nasceu? Questões 
Do além; irrelevâncias quando já não há voz! 



(c) Filipe M. | texto e fotografia (2016)

domingo, 24 de julho de 2016

Sul

Desenhar o círculo interior, ou mesmo tu
Também. Cantemos a invenção o dentro
Do possível dentro; tudo é potência uma 
Especulação que nos exporta reinvenção 
Do fora. Posso dizer por igual: uma porta
Uma janela, um copo, a pele, o ensejo do 
Beijo na aurora. Fronteira estival a perder 
De vista: eu teu lúcido nu silêncio quente
A boca fermenta Evoque-se nossa morte 
Morramos a sul morramos no mar ao sul.
Não há nada p'ra lá do mar azul. Séquito
Ide depositar-me; serenamente morrente!



(c) Filipe M. | texto e fotografia (2016)

sábado, 23 de julho de 2016

Começos

É um facto; foi de noite que te conheci. Aquele 
Café, o artifício da linguagem e o olhar que vê
Disfarçado o teu e procura retribuição. Depois 
Pausas, eternidades, pares de mãos nervosas
E a primeira palavra atontada da retoma ávida 
De normalidade falha de cumplicidade a gerar
O riso mútuo: um momento cheio, uma ponte,
Uma bóia a que se agarram os náufragos não 
Com volúpia, apenas o antemomento pueril, o 
Aceitar dum doce inesperado. Na amarragem
Traz-se o barco ao cais acima da inconstância 
Das águas e nós, superfície lisa, acima do que 
Cada um especula ou já desfaz. Um facto: era 
Verão; era uma noite de verão. Fora essa noite
Por anos; foi uma noite de verão por anos, um
Tipo novo de felicidade o ser feliz assim: feliz!
Chegado a casa vieras comigo sem o saberes
Sorria. Mais tarde subiste. Os frutos da árvore 
Trouxeram a estação nova. O beijo caiu sobre 
A pele. Não imagino mais bela ceara tua noite.
Diz quem o ignora que é de manhã o começo!



(c) Filipe M. | texto e fotografia (2016)

terça-feira, 12 de julho de 2016

Elísios

"Edificámos casas (me)moráveis dentro de nós."

Só aos mais altos dentre nós é dada uma  

Voz que nos convoca para a matéria alta  

Do Sonho! E quando ele emerge Pleno e 

Claro essa mesma voz é todola rasa de

Silêncio para que só se nos oiça a nós!



Oh argonautas investidos de céus

Que no-los desvendaram p'ra que 

Os soubéssemos quase tão perto;

Para que os demorássemos belos 

Gratos e felizes nos abraços dados

No voo aberto sob a bandeira única.



Filipe M. | textos (2016)


segunda-feira, 11 de julho de 2016

Um dia

Meu pai faz sol, meu pai faz saudade 
Meu pai já tenho idade, meu pai amo
Meu pai um rio, meu pai tua a cidade 
Meu pai tua mulher teus filhos somos 
Meu pai teu pai tua mãe teus irmãos 
Meu pai os dias são flores tuas mãos
Meu menino pai zelo teu sono eterno
Meu pai mata-se tanta gente e nasce
A cada bala néscia um bebé risonho! 
Meu pai um dia, assim possas, vinde 
À mesa alta dos alimentos sagrados 
Sentai-vos à cabeceira e falemos da
Faina fresca em cabazes de lota que
Somos juntos apregoados os nomes 
Que trazemos dias fartos ou magros 
Cabem todos no que por cá fazemos
Meu pai por onde andais? Esta ficção 
De parecer que te inventámos ou que
Nos inventámos a nós por medo quiçá
De te esquecermos. Pai, dorme agora! 



(c) Filipe M. | texto e fotografia (2016)

domingo, 10 de julho de 2016

A busca incessante

Pessoa certa; passo incerto como convém a 
Quem seu desacerto se acerta na marcha; o
Tal que se inventa, que se inquieta; desperta 
Sonhos e iras sãs de quem tem as dores por
Ser maior que a medida dos seus pés. E ama
Ama tanto, loucamente procura regaços p'ra 
Seus cansaços e quimeras altas que o voam. 
O ser assim gente que se enobrece apetece!



(c) Filipe M. | texto e fotografia (2016)


sexta-feira, 8 de julho de 2016

Entre nós

Faria hoje, sim faria hoje esse dia 
Um dia acima de todos os outros 
Um dia nosso da soma de muitos 
De tantos, contas d'anos dum rio 
Cheios dos defeitos, ainda assim
Muitos houve assim-assim, mais 
Ainda todolos aqueles tão felizes 
E tivemos filhos e envelhecemos. 
Fomos, somos o Amor entre nós. 

[Aos meus pais, dia do seu casamento]


(c) Filipe M. | texto e fotografia (2016)

quarta-feira, 6 de julho de 2016

O Pastor

Brandos braços brancos do moinho:
Volteiam pás vendavais ais d'agonia
São mundos que me trazem comigo
Ao sabor das ruas onde, campo alto
Ceara fruto oiro colhem de pessoas 
A espiga e eu repouso do descanso
Que chama tresmalhados cansaços
À voz paternal do pastor poiso meu 
Bordão. Entregue por fim meu sono.



(c) Filipe M. | texto e fotografia (2016)

terça-feira, 5 de julho de 2016

Haver

Supus tudo isto e mais ainda 
E quando não dissemos nada 
Soube, dum saber ante e p'ra 
Além de mim, que irias morrer.
E fiquei a olhar-te antes e para 
Além de ti a perceber que tudo
Tem por antecipação um nascer 
E quando tropeçámos distraídos
Já cá não estás e os dias fingem
Que são aqueles dias antes deste
Casas de papelão a fazer de conta 
Que há em nós continuação. Fadas
Pão-de-ló Os aniversários mentiras 
Cristalizadas, frutos secos, amargos
Embalados, presentes dourados nas 
Árvores de dezembros natais Poema 
Onde cabemos na memória do nome: 
Pai nosso que estais tão longe de nós 
Vem buscar-nos Esta eternidade dura 
Há tempo demais; pão ázimo teu beijo
Nos dais hoje assim na Terra haja Céu. 


(c) Filipe M. | texto e imagem (2016)

segunda-feira, 4 de julho de 2016

Diário

Há um exacto momento em que nenhuma
Ideia de passado nem qualquer suposição
De futuro me traz presente. Inexistência!?
Não; um permanente excessivo contrário:
Algo cujos limites de início e fim desenha 
Uma infindável planície, impreciso rumor 
Sem zonas curvas como é suposto numa 
Esfera. O calor estival produz esse sentir
Débil onde os corpos se exaltam Apogeu
Que convida à dança nua que se esvazia
E nos dá o mesmo preciso lugar. Estupor 
Que aquieta e nos faz terroso miméticos 
Não se cruzam ido e vindouro: presente
Estático, presente intacto, sem condição 
De liberdade. A imagem treme imprecisa
Não me foco e sucessivas ondas perdem 
Pé. Horizonte, horizonte azul descoberto
Nada é perto, o longe é para lá do braço
Onde só a mão desliga o dia a tempo do 
Cigarro do copo do corpo do sexo febril. 
O traço certo, exausto pede comutação. 
Entro. Entro num lugar. Ah sombra solar!


(c) Filipe M. | texto e fotografia (2016)

sexta-feira, 1 de julho de 2016

(a)onde

Já lá vai algum tanto nenhum tempo
As mesas dos cafés têm os mesmos 
Exactos sítios a saber de cor lugares 
Que inventei anos depois da verdade 
São agora tudo aquilo que eu quiser!
Já os posso olhar, são apenas tristes 
Onde não tenciono voltar porque não 
Posso o verso que calcinou os gestos 
Que planavam no ar voos imaginários
Trazendo-me dum sítio onde ficasse!


(c) Filipe M. | texto e fotografia (2016)