quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Dezembros: enunciação

"da espera nunca o esperado,
dos olhos jamais a coisa olhada, 
as mãos hipotéticos sonhos, 
na vez do corpo, infames, em nós, tantos outros 
por sabermos que é de amor que se veste o que despimos
talvez me tenhas dito já falta pouco e, pouco a pouco, o ocaso ou a enunciação duma falta..."
Filipe

(c) Filipe de Macedo | fotografia: B.º Alto, Lisboa, 2014. 

terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Dezembros: do partir e ficar.

Por vezes parte-se porque se quis ficar. Por vezes só se fica, partindo. 
E somos tudo aquilo à volta do que não-somos (ou deixámos de ser). 
E percebemos que, com o devir, a dor é, talvez, um pássaro em flor. 
Não a daquela primavera inaugural; uma outra, outonal, em que a exuberância dá lugar ao afago que o cansaço encontra na ternura magoada. 
E a tristeza não mais um lugar mas caminho para que possamos chegar a nós e depois de nós... a ti:
uma primeira vez,
uma última vez.

(c) Filipe de Macedo | fotografia: Madeira, 2014. 

Dezembros: desleixo

"(És) o eixo onde me descentro." Filipe

(c) Filipe de Macedo | Fotografia: Av. do Mar, Funchal. 

segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

De-va-gar...

Porque e para onde vamos tão depressa!? 
Depressa para lado nenhum, talvez. 
Não há caminho; nem de onde para onde. Depressa não-Ser. Parar é pensar. Acelerai, por favor! 
Tenho medo de Ser. 
Dói Ser.
Acelerai mais! 
Mais ainda, por favor! 
Parai! Ainda assim, prefiro Viver!
De-va-gar... 

(c) Filipe de Macedo | fotografia: Calçada da Bica Grande (Lisboa)

Dezembros: Rotativas

(c) Filipe de Macedo. 

domingo, 28 de dezembro de 2014

Dezembros (2013)

Recebi-a educadamente. Fez-se da casa como se dum velho amigo se tratasse. Mas enfim...tinha bons modos, pouco ou nada se fazia notar. Melíflua, prestável; foi ficando. 
Tomou, na sua transparência, paredes, portas, soalhos, tectos e janelas. Depois, gestos, palavras, sonhos. Os dias tornados meses. 
Crescia, assenhoreava-se (sempre com bons modos; irrepreensíveis modos! Delicados modos!) decrescia eu: em palavras, em gestos, em sonhos. 
Era o avesso do fato com que saia ela à rua na vez minha. Sombra assimétrica. Descompasso. 
E era já ela tanto e eu tão pouco que toda ela já era a casa onde quem já não cabia era eu. Ficou lá a morar a tristeza (seu nome) e vim morar para as ruas da alegria. 

(c) Filipe de Macedo / Fotografia: S. Paulo, Lisboa. 

Novembro (2013)

Para lá da janela certamente gente dentro, dentro da luz que devassa a rua e me retarda o passo. 
Invento-lhe histórias como se vestisse manequins a meu bel-prazer. Rua silente e fria no arrumo do dia para a noite. Estugo o passo rumo ao dentro duma outra luz, duma outra casa, também esta pondo luz numa outra rua. 
E no seu recesso leio; abro um livro como quem espreita casas inventadas, com gente e mundos inventados. 
E quando chegar o sono fechá-lo-ei como se o desligasse pelo interruptor. E passeio pelos livros como se lesse ruas. 

(c) Filipe de Macedo / fotografia: Terreiro da Paço, Lisboa. 

Outubro (2014)

E a tua noite chega à minha manhã. 
Sei da espera e do quarto alastrando-se pela casa e o mundo, improvável, a caber todo na moldura da janela. 
E os objectos são calendários ou quando a noite se alinhava com a noite e quando amanhecia de manhã. 
E quando saio às ruas há o quarto em cada passo e a cada passo mais adentro o quarto e a noite que lhe é dentro. Quando saio à rua há corredores e aquela porta sempre nos seus fins. 
E tu não vens como vinhas e eu já não chego quando partia.
Outubro, 2014

(c) Filipe de Macedo 

Cesário

"Vi nos legumes carnes tentadoras, 
Sangue na ginja vívida, escarlate, 
Bons corações pulsando no tomate 
E dedos hirtos, rubros, nas cenouras." 
[in 'Num bairro moderno', Cesário Verde]


sábado, 27 de dezembro de 2014

Uma conversa a um para dois.

Há cerca de dois anos e meio descobri a(s) rua(s) como espaço habitável; casa(s) antes e depois da casa. Nesse itinerário íntimo reencontrei-me nas imagens e nas palavras. Indumentárias duma nudez súbita. Daí o nome do blog: "Poema além do belo", excerto dum poema de Ezra Pound. Fronteira de possibilidades rememoradas quanto inventadas. Daí também assiná-lo com o meu nome 'íntimo': Filipe. Demorou vinte anos a fazê-lo mas no mês de todos os 'meus' dezembros permito-me agradar-me. Em certo sentido, enceno uma conversa entre o Filipe e o Luís, que, sendo um só, são, todavia, inquilinos distintos duma mesma casa. É apenas isto: "Vida Conversável" (Agostinho da Silva) ou o "aberto do mundo" (José Tolentino Mendonça). Sem filtros de alma. 
Filipe. 
Funchal

(c) Filipe de Macedo [Fotografia: Av. do Mar, Funchal, 2014]