A partir dum dado momento compreende-se; compreender é entrar no compreendido e vermo-nos a partir daí: o onde peixes saem da água e as aves lhes tomam o lugar porque os territórios se tornam intolerantes às paredes. A terra aspira ao céu; sempre assim foi; sempre assim será. Não por ser verdade; não forçosamente por ser verdade. Mas por ser um desejo, quiçá mais forte do que qualquer verdade, de abrir mão de tectos, de chãos, de portas, de janelas, de paredes e de telhados e vivermos o aberto porque edificámos casas (me)moráveis dentro de nós. Mas deixemos as varandas: são os palcos das ruas do mundo.
quarta-feira, 30 de dezembro de 2015
terça-feira, 29 de dezembro de 2015
Doce-lima
Doce-lima
Nasces do
Pé p'ra mão
Teu aroma é
infusão que
Adentra meu
Frio coração
Que pela tua
Boca de loiça
Me beija e de
Tão feliz logo
Se m'aquenta.
segunda-feira, 28 de dezembro de 2015
Dentro
Sim: o amor. Substância de irradiação própria. Extrínseca. Reverbera sobre a pele, um laranjal, a pluma do ar, o sal do mar; a nua planície, toda ela lunar; toda ela boca vaginal da sede dessa água, desse curso de humores. Bem sabemos que não é luz própria que se acende, contudo acendemos um espelho aberto nascendo aos olhos um do outro e há o braile gramatical dos corpos onde as mãos desenham por fora tudo o que de inefável trazemos nos nossos dentros.
quarta-feira, 23 de dezembro de 2015
O prodigioso verbo
A tristeza precisa do dentro para encontrar a cama onde se expandir no húmus da terra para onde vamos e daí gatinhar e erguer-se em flor seminal; a alegria precisa do fora para encontrar o ar aberto de todas as possibilidades de sermos aquela prometida flor cujas asas lhe dão prumo e na altura certa da estação que formos tomar as suas tantas diversas feições: aladas criaturas de mar, de terra, de ar e de amar - prodigioso verbo que te traz inteiro donde quer que vás.
segunda-feira, 21 de dezembro de 2015
domingo, 20 de dezembro de 2015
sábado, 19 de dezembro de 2015
O casaco
Um dia vi um adulto por dentro
Todo ele miúdos encavalitados
Escondidos no comprido dum
Casaco que se traz vestido na
Aparência destemida das ruas.
quarta-feira, 16 de dezembro de 2015
Esse Homem
O frio cinzela a silhueta do homem. Podias ser tu; não que ande a avistar-te nas desoras das ruas que me passeiam daqui para ali, cesura de vida, no jogo do amanho à estiva dos dias que visto e que me despem assim queiram. Há uma cantiga antiga que se repete e que faz seu ninho no telhado da memória e que te traz (de) novo até mim; eu que ando a dobrar-te os passos. Somos quase sempre as mesmas pessoas ainda que façamos incursões aos nossos lugares mais longínquos. Mas depois..., depois regressamos a casa do fim de semana de nós julgados outros revigorados. Sim, podes sentar-te aqui comigo porque não vou a lugar nenhum além de mim. Nós somos sempre um lugar a que recorremos para não nos esquecermos porque viemos de tão longe: é preciso um perto. O mesmo lugar onde nos deixámos quando fomos. Eu sei, o Natal dói e o menino Jesus tem frio; é inverno aqui nesta Judeia de dezembros ocidentais. Sim, fuma à vontade! Nada é mais letal que viver a longo prazo e bem sabes que os livros pedem por igual medida olhos que os leiam e mãos incandescentes que os folheiem, como se ler fosse alto lugar onde se queima papel. A mesma cantiga em surdina a cantar-me "Wake Up Dead Man", a morder a sobriedade da dor enxuta, moderna e vivaz na ostentação do desprezo do luto que não fica bem de gel. Sou forte, sou a minha própria invenção! Sou urbano, sou mundano; sou moderno (falho de antiguidade) eu tenho um colete à prova de bala! De lado a lado perfurado. Balada tão só. Fiz anos mas não sei o que eles fizeram de mim? Estou aqui e tu aí. Na partitura, no sopro da melodia e seguro com alfinetes de dama o dia que cai e o frio desenha na ardósia do ar os brancos da respiração. E cada vez que me digo, relapso, que não há ilusões, no contra-campo crio uma outra ainda maior. Canto porque só me resta a sentinela do medo que tem no frio a última fronteira do real. Sabes, o calor trago-o como um frio desconhecido desde esse dia de verão em que te fomos enterrar. É quase Natal, é quase um ano novo, é quase eu tal como fora. É quase o amor inteiro e não um cigarro de cinza na borda do cinzeiro deste lugar que inventei.
terça-feira, 15 de dezembro de 2015
Por fim a chuva
No ar uma saturação de felicidade; aquele exacto momento em que o olhar nos diz que a boca reencontrará o caminho do beijo. Na hora feliz, estou certo, começará a chover.
domingo, 13 de dezembro de 2015
Lucidamente
A lucidez não é achar que possa estar certo; é metodicamente achar que posso estar errado.
sábado, 12 de dezembro de 2015
sexta-feira, 11 de dezembro de 2015
quinta-feira, 10 de dezembro de 2015
Mas...
Sei hoje o que é um jardim:
O que floresce em torno do que perdemos.
Não devolve, mas devolve-nos;
Não restitui, mas restitui-nos.
Não é o lugar que onde foste ,
Mas é o lugar onde te sou.
Ave Maria (Maria Bethânia)
Ave Maria
Nos seus andores
Rogai por nós
Os pecadores
Abençoai estas terras morenas,
Seus rios, seus campos
E as noites serenas
Abençoai as cascatas
E as borboletas que enfeitam as matas
Ave Maria
Cremos em vós
Virgem Maria rogai por nós
Ouve as preces murmúrios de luz
Que aos céus ascendem
E o vento conduz
Conduz a vós
Virgem Maria
Rogai por nós
[Vicente Paiva: Jaime Redondo]
Alto trato
Nunca me tinhas morrido antes
Nunca nasceras depois de mim
É negócio teu com Deus de que
Não fui parte mas se partes digo
Que o faças sorrindo os dias que
Por cá andaste pois que serão os
Suficientes para que os revivamos
No tempo precisado para da nossa
Própria vida fazer-se grado distrato.
quarta-feira, 9 de dezembro de 2015
Aniversário (II)
Duarte (Nuno) não sei responder às tuas palavras de hoje que me vestirão para sempre nas piores invernias, por isso dedico-te a carta que vou agora enviar ao Hélder.
"Meu pai, estou feliz porque sei que estás feliz porque o teu Pipo (não te zangues: agora quem me gosta pode chamar-me assim porque são vozes da tua voz primaz) faz anos; completa-os. São 46 que terminam! 47°, bem-vindo (tem 7, soa bem!) E gosto, fico mais perto de amar melhor, de me perdoar e de compreender melhor os outros. Pai há tanta gente a gostar de mim; eu sabia que sim: não tinha percebido era que eram tantas e tanto o seu gostar. Estava zangado quando disse que não tinha sonhos; tenho. Todos realizáveis. Porque todos pequenos de enormes que são. É por isso que as sombras são o voo da matéria: um corpo servido por asas. Chorei hoje no rio onde moras e depois percebi que rio é também um modo de rir e por isso ri e sorri. Estas pessoas de quem gostas porque me gostam disseram-me coisas lindas e vestiram o dia que temi incolor com cores que o arco-íris apenas começa. Com a idade vamos precisando de menos coisas e chegam a mim os aromas das suas essências. Da materialidade necessária à condição feliz se se viver chegam-me ecos tranquilos do horizonte de imaterialidade duma mala (com o estritamente necessário) que faço grato. Ensinaste-me que as pessoas que nos querem bem são janelas que se abrem por fora. Hoje emprestaram-me uma mansão para que as janelas fossem muitas; não para me fazerem esquecer duma tristeza que trago numa humanidade que vivo inteira mas para que a vivessem comigo. E sabes, era como se cada telefonema, cada mensagem, cada gesto, cada presença (e a tua: tão antes, tão durante, tão depois e tão depois do depois) me alijassem o peso. E estou leve e por isso pude subir ao céu para te beijar e mergulhei ao mar para te abraçar. Minha mãe: os teus olhos e os teus braços fazem par com o par dos dele. Não na vez dele mas com e por ele. Nuno, mano, sobrinha e Patita proas deste meu barco. Aos que me amam a minha gratidão pelo amor que me dão e, se possível, mais ainda, por me ensinarem a ser um mundo inacabado para que este se abra aos mundos dos mundos. Hoje sei que o grande desafio que se me coloca é o de saber receber, mais do que saber dar (Helas!) Não para me tornar vaidoso, mas para destruir, espero, a subtil arrogância de querer ser transparente. Vocês todos são os meus óculos 3D, avatares da poesia do real. Bjos & abraços para todos vós e sejam felizes de felicidade real. Pai vou-te dando notícias minhas e de todos.
Beijinho
Pipo
8 de Dezembro de 2015 ❤️"
Aniversário
Somos longe
Mais eu de ti
Que tu de mim
Tens-me assim
Tu que me vês
Por inteiro daí
Eu adivinho
Invento um
Lugar para ti
Aqui onde
Te guardo
E aguardo
Dentro no
Inacabado
Perto do
Abraço
Dado.
[Pipo]
Equívocos
Desdizendo a sombra
Não aclaro a pluma da luz
Negando o baixo
Não princípio o alto
Ocultando o assombro
Não amanheço o sonho
Se não disser 'podes partir'
Nunca o amor irá chegar
Se antes não souber
Não poderei aprender
Se não acreditar
Nunca com meus
Próprios braços ser
O belo de voar acima de
Mim para te encontrar
Diário de bordo
Ontem e hoje foram dias felizes. Chegar a casa e ter-te lá. Falámos, olhámo-nos no silêncio duma saudade ora rida, ora chorada. Partilhámos o mesmo homem e o que somos para além dele, com ele e por ele: o companheiro e o pai. Falámos doutro amor partilhado: um filho, esse mesmo que me é irmão. Fomos serenos e as mãos casaram no agasalho dum Dezembro novo em que procuramos sentidos novos para as coisas dos dezembros antigos. Fui filho e, por vezes, menino. Hoje és a menina que há muito não eras e por isso dissemos as ruas noutro passo. O que se ampara na noção da fragilidade mágica de cada gesto, de cada palavra, de cada memória acarinhada onde se sacia, como se pode, uma memória que nos futura num tempo já breve. É bom fazeres-me casa como dantes fazias bolos. A doçura tem os mais diversos açúcares para a temperança que traz a ternura. À noite servi-te um chá quente de amor e nos teus olhos bebi toda a minha sede de ser, seja o que for.
Filiação
Que lugar é este?
Quem sou este lugar?
Que ficou do que havia?
Pouco importa; a resposta
É sempre filha da pergunta.
segunda-feira, 7 de dezembro de 2015
Breviário
Já não estás, mas estiveste.
(Tanto tempo nesse instante)
Nada foi como dantes mas há
Sombras de luz pelos recantos
Da casa que trouxeste; aquela
Que deixaste para que nela me
Demorasse o tempo que quisesse.
domingo, 6 de dezembro de 2015
Para onde o mar?
Era a maré alta
À gola da água
Onda do corpo
Todo seu caber
Sou maré vaza
Ao rés da água
Corpo afogado
No chão secado
[Para onde ido o mar?]
Sou eu que não me vejo
Era já por mim adentro
Toda essa água entrada;
Sou um tanque cheio de
Sereno contentamento.
quinta-feira, 3 de dezembro de 2015
Alvo
A boca abre a sua inteira noite
Derrama derruba crude cru as
Aves sem aviso ensaiam voos
Condenados e cantam cantos
Desalentados e pesadas asas
Pesam o peso da esperança e
Adejam lutuosas, lustrosas no
Indevido chão e corro branco
A sua bela dança final e beijo
Branco o preto manto do mar.
quarta-feira, 2 de dezembro de 2015
Um tudo-nada
O nada é uma imensidão impante
Onde não cabe coisa nenhuma;
Prefiro a península do tudo, onde
Cabem o todo, a parte e a vontade.
segunda-feira, 30 de novembro de 2015
domingo, 29 de novembro de 2015
Haver
Quando te vi soube que te amaria.
Mas o compasso da chegada traz
Antecipado por igual o da partida.
Poisa no ramo de mim esse amor
Que em ti havia mas cada asa tem
Metade de céu no intento do voar.
Também os barcos aportam mas
É do seu sentido o mar navegar.
sábado, 28 de novembro de 2015
Arredondado
Dizem que o amor se gasta nas arestas;
Digo que é no redondo que se no-lo escapa!
Filipe M. | texto e fotografia (2015)
sexta-feira, 27 de novembro de 2015
27
O peixe do rio foi viver o mar
Tingindo de rio a prata lunar.
Nascera no sentido veloz da
Foz: a vasta porta do mundo
E viu todos os líquidos céus
No júbilo amplo da liberdade.
Um dia subiu a primeira vez
Esse rio e contou que viveu
Em longínquos lugares mas
Que é à casa onde se nasce
Que, grato, se vem morrer.
Na maré vespertina dos
Nossos (a)braços ficou.
quinta-feira, 26 de novembro de 2015
quarta-feira, 25 de novembro de 2015
Da alegria (Tolentino Mendonça)
Fácil é ser triste. O mais difícil é permanecer na alegria!
[Tolentino de Mendonça]
domingo, 22 de novembro de 2015
DB: 21 Nov.
Aconteceram tantas coisas; circunstâncias a que pude dar nome. É estranho, mas real, o quanto reconforta nomeá-las. Entendo agora a solidez dum substantivo. Só agora! Tantos 'só agora' nestes tempos recentes. E aqui estou à mesa, neste 'estar à mesa' que me abraça, a desembrulhar o sábado onde café, chá e mel servem seus leves aromas inaugurais e deixo o sono pairar na sua cadência morna e frutada na passagem ritual para o dia levantado.
Tantas coisas 'desacontecidas' (há mais verdade assim). Gente que se ausentou; e são eles, os seus nomes, que se sentam aqui comigo nesta primeira ceia. O nome do pai que tive, o nome do amor que tive - é estranho isto de ter e deixar de ter - pairam generosos, na transcendência da matéria. Talvez seja isto a memória: aroma. Há este doce silêncio azulado, que mantenho zelosamente, como se os prolongasse talvez um pouco mais ou serem a água
fresca que pelas mãos lava o meu rosto de acordar. Talvez!
quinta-feira, 19 de novembro de 2015
A vez
Ao deitar-me fica entreaberta
A porta pela dobra do lençol
Para que haja o rumo da luz
No escuro para que possas
O meu corpo no destino da
Primavera esta primeira vez.
terça-feira, 17 de novembro de 2015
Sertão (Caetano Veloso)
A luz a paz
Da voz da voz em mim
É o amor que conduz
E traz aqui
E diz sim em nós
E não tem fim
O céu o ar
O azul do azul daqui
Desse mar desse chão (...)
Terminar se não
No coração
[Caetano Veloso, Moreno Veloso]
segunda-feira, 16 de novembro de 2015
Coisas pequenas (Madredeus)
Coisas pequenas são coisas pequenas
São tudo o que eu te quero dar
E estas palavras são coisas pequenas
Que dizem que eu te quero amar
Amar, amar, amar
Só vale a pena
Se tu quiseres confirmar
Que um grande amor não é coisa pequena
Que nada é maior que amar
['Coisas Pequenas, Madredeus / Pedro Ayres de Magalhães]
domingo, 15 de novembro de 2015
Herberto Hélder (Poema III)
Não sei como dizer-te que minha voz te procura
e a atenção começa a florir, quando sucede a noite
esplêndida e vasta.
Não sei o que dizer, quando longamente teus pulsos
se enchem de um brilho precioso
e estremeces como um pensamento chegado. Quando,
iniciado o campo, o centeio imaturo ondula tocado
pelo pressentir de um tempo distante,
e na terra crescida os homens entoam a vindima
— eu não sei como dizer-te que cem ideias,
dentro de mim, te procuram.
Filipe M. | fotografia (2015)
Nelson Mandela
"Quando eu saí em direção ao portão que me levaria à liberdade, eu sabia que, se eu não deixasse minha amargura e meu ódio para trás, eu ainda estaria na prisão" [Nelson Mandela]
Filipe M. | fotografia (2015)
Hérberto Hélder (Poema II)
E já nenhum poder destrói o poema.
insustentável, único, | invade as casas deitadas nas noites, | e as luzes e as trevas em volta da mesa |[Herberto Hélder]
quarta-feira, 11 de novembro de 2015
No teu casaco
Visto o teu casaco
Por dentro o visto
Como o teu abraço
O teu sentar sento
O teu deitar deito
O teu rosto leve
Levo ora comigo
Ângulos mortos
Ocultam traços
Dos teus passos
E as tuas mãos
Falaram tão alto
E eu não escutei
E o relógio parou
E os ponteiros
Abriram a hora
Nova onde ainda
Não tenho vaga
E procuro os teus
Tamanhos e de
Boca em boca
Pergunto por ti
E os meus lábios
Saberão sempre
Ao gosto da tua
pele, fronte doce
De frutos beijada
Murmurando as
Palavras que me
Dão o lugar certo
Porque me dizias
Que tinhas que ir
Mas que teria eu
Que ficar porque
Os teus amores
Teria que curar.
Pediste para ir
Que vás na paz
Disse dividido
Sorri chorando
Pouco depois
Nasceu o sol
E nunca mais
Anoiteceu.
segunda-feira, 9 de novembro de 2015
O arco
Cada palavra emerge pura e alta do magma do indizível silêncio, da indivisível matéria erguido.
Porta-contentores atravessam os mares imateriais com seus pesados materiais gramaticais trazendo-os à altura dos olhos de verdes vagas iniciais.
Dois lábios não são forçosamente uma boca ou dizer a flor toda em pensamento é uma metade.
O que não tem dentro falha por fora: espelho que se espelha porque ninguém mora.
Quando a nave aporta vinda de lugares há o beijo inteiro da flor e sentamo-nos dois no paredão onde os rostos (os que se permitem sonhar), espreitam reflectidos na água que batiza os pés e abrimos, deslaçando, as ondas natalícias e por nossas próprias mãos as palavras dão-se ao silêncio vindas.
Estamos ali, inteiros, investidos e capacitados.
Arqueio o corpo e recebo o teu.
sexta-feira, 6 de novembro de 2015
Joaquim Pessoa (Ilha)
Houve uma ilha em ti que eu conquistei.
Uma ilha num mar de solidão.
Tinha um nome a ilha onde morei.
Chamava-se essa ilha Coração.
[joaquim pessoa]
quinta-feira, 5 de novembro de 2015
Herberto Hélder (Poema I)
E o poema cresce tomando tudo em seu regaço. E já nenhum poder destrói o poema. (...) E o poema faz-se contra
a carne e o tempo. [Herberto Hélder]
terça-feira, 3 de novembro de 2015
Por fim
Eu sabia que um dia
No medo corri todas
As ruas de mim saídas
No ganho enganado de
Saber o passo adiante
E pensando que me
Escondia não sabia
Que era nesse meu
Próprio galope que
No dorso já seguias
Eu sabia que um dia
O anti-dia chegaria...
sábado, 31 de outubro de 2015
Diário de bordo
A mais bela das tristeza: a que não se conforma; a que sorri, ousa e dança, a que traça rumos paralelos, mesmo que irreais. E por isso também, profundamente generosa; isto porque na amputação do não-vivido crescem os lugares de todas as possibilidades.
sexta-feira, 30 de outubro de 2015
Duma certa forma
Duma certa forma as tuas mãos aqui
E tudo um agora raso e como demora
Atravessar a imensidão dessa palavra.
O que me sustém e me impede desta
Planície deste Alentejo chão onde me
Deito ao comprido do dia em gelo frio
Onde me queimo devagar deste vazio?
Onde as arestas ou o cabide dos teus
Olhos onde me despia? No colo dizias
E tu dizias que haveria. E não haverá!
E a adultícia é tão curta para abraçar
Para embarcar o arco-íris da infância
Para onde foste oh meu olhar d'amor
Que não me vens trazer ao portão do
Dia começado e desde logo acabado.
Porém os pés de esperança calçados!
quinta-feira, 29 de outubro de 2015
Diário de Bordo
O sonho prolonga o que não permite a vida. O que é uma metade? Meio caminho ganho à casa da partida ou meio caminho perdido para a casa da chegada? Há uma metade que chora, outra que ri; uma que ficou, outra que partiu, ainda que pela inventiva, como se algo em nós recusasse, por vezes no limite do absurdo, a sua própria condição.
quarta-feira, 28 de outubro de 2015
Pelas tuas mãos
Trouxe-me nu e despido
Inteiro em meus defeitos
És tu que me vestes das
Virtudes do branco linho
Que me havia esquecido.
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