sábado, 30 de julho de 2016
sexta-feira, 29 de julho de 2016
Sopro
Se porventura morresse hoje neste agora
Que soubesses que aquele teu olhar sob
Os teus cabelos voantes minha mortalha.
quarta-feira, 27 de julho de 2016
Inquietações
Até uma determinada altura, pude
Exactamente o quê não sei bem e
Não sei bem exactamente o que
Deixei de poder. Enfim, bem sei
Que um fato não é peça única
E que é o anonimato da linha
Que cose as partes que lhe
Dão aquela junta aparência
E quando saímos da linha lá
Se vai a compostura; vai daí
Andamos aos papéis, porque
Precisamente sem nenhum! E
Ainda que entre o que pude e
O que não posso agora, possa
Haver uma distância ínfima que
Caiba na cabeça menor e maior
Que seja é ainda assim abissal o
Transtorno. Transtorno porque se
Interrompe a marcha e transtorno
Porque deixamos de perceber seu
Sentido; isto é: porque a fazemos e
Um clássico o donde e o para onde!
Quando deixamos de poder espanta
Como pudemos. Se houver por acaso
Retoma a perplexidade ganha sentido
Inverso: como pudemos ser incapazes
Quando já tão capazes somos. Questão:
Ainda que saiba as somas destas razões
Que conduziram àquele ser incapaz disto
E daquilo falhamos sempre o minuto zero!
Mais que tudo é essa imprecisão do tempo
E do teor: a dupla indeterminação frustante.
Porque fomos capazes e depois incapazes!?
Em que preciso momento uma coisa e outra?
terça-feira, 26 de julho de 2016
Rua da Rosa
A rosa rua
É tua boca
P(rosa) nua
Rua da rosa
Rosa rosário
Pétala, pedra
Rosa nome de
Flor Rua d'amor.
segunda-feira, 25 de julho de 2016
A fronteira ténue
Naquele sítio onde havia gente soube hoje
Da minha morte! Só foi inesperada porque
De há muito por mim esperada. Boa gente
Mo disse Cedo dei inicio àqueles preparos.
Nunca sucedera sofrê-la tão pronunciada,
Tão afirmativa. A força da coisa impôs-se,
Dissipando qualquer lirismo ou deslocado
Sentimentalismo Formalidades mundanas
Tomam a primazia. O além tem alfândega.
Exéquias sóbrias, necessárias ao consolo
De quem fica em nome de quem parte. À
Parte uma ou outra lágrima foi escorreito
E contido o magro cerimonial conforme à
Sua vontade e amigos de sempre põem o
Contra-campo do anedotário logo em dia.
Sabes que não há repentes nestes casos;
Há insinuações, murmúrios preparatórios,
Que se lidos a tempo maduram a estação,
Amortecem a queda com sorte talvez até,
Travada por mão amiga. Mas o descaso é
Cegueira atontada; o pensamento mágico
Os seus resquícios trazemos à infância do
mundo. Nessa ilusão nem damos conta de
Que se altera a condição Estar morto pode
Ser de ténue percepção estranha-se muito
Pouco o novo estado nada mais do que isso.
Quem era depois? O que nasceu? Questões
Do além; irrelevâncias quando já não há voz!
domingo, 24 de julho de 2016
Sul
Desenhar o círculo interior, ou mesmo tu
Também. Cantemos a invenção o dentro
Do possível dentro; tudo é potência uma
Especulação que nos exporta reinvenção
Do fora. Posso dizer por igual: uma porta
Uma janela, um copo, a pele, o ensejo do
Beijo na aurora. Fronteira estival a perder
De vista: eu teu lúcido nu silêncio quente
A boca fermenta Evoque-se nossa morte
Morramos a sul morramos no mar ao sul.
Não há nada p'ra lá do mar azul. Séquito
Ide depositar-me; serenamente morrente!
sábado, 23 de julho de 2016
Começos
É um facto; foi de noite que te conheci. Aquele
Café, o artifício da linguagem e o olhar que vê
Disfarçado o teu e procura retribuição. Depois
Pausas, eternidades, pares de mãos nervosas
E a primeira palavra atontada da retoma ávida
De normalidade falha de cumplicidade a gerar
O riso mútuo: um momento cheio, uma ponte,
Uma bóia a que se agarram os náufragos não
Com volúpia, apenas o antemomento pueril, o
Aceitar dum doce inesperado. Na amarragem
Traz-se o barco ao cais acima da inconstância
Das águas e nós, superfície lisa, acima do que
Cada um especula ou já desfaz. Um facto: era
Verão; era uma noite de verão. Fora essa noite
Por anos; foi uma noite de verão por anos, um
Tipo novo de felicidade o ser feliz assim: feliz!
Chegado a casa vieras comigo sem o saberes
Sorria. Mais tarde subiste. Os frutos da árvore
Trouxeram a estação nova. O beijo caiu sobre
A pele. Não imagino mais bela ceara tua noite.
Diz quem o ignora que é de manhã o começo!
terça-feira, 12 de julho de 2016
Elísios
"Edificámos casas (me)moráveis dentro de nós."
Só aos mais altos dentre nós é dada uma
Voz que nos convoca para a matéria alta
Do Sonho! E quando ele emerge Pleno e
Claro essa mesma voz é todola rasa de
Silêncio para que só se nos oiça a nós!
segunda-feira, 11 de julho de 2016
Um dia
Meu pai faz sol, meu pai faz saudade
Meu pai já tenho idade, meu pai amo
Meu pai um rio, meu pai tua a cidade
Meu pai tua mulher teus filhos somos
Meu pai teu pai tua mãe teus irmãos
Meu pai os dias são flores tuas mãos
Meu menino pai zelo teu sono eterno
Meu pai mata-se tanta gente e nasce
A cada bala néscia um bebé risonho!
Meu pai um dia, assim possas, vinde
À mesa alta dos alimentos sagrados
Sentai-vos à cabeceira e falemos da
Faina fresca em cabazes de lota que
Somos juntos apregoados os nomes
Que trazemos dias fartos ou magros
Cabem todos no que por cá fazemos
Meu pai por onde andais? Esta ficção
De parecer que te inventámos ou que
Nos inventámos a nós por medo quiçá
De te esquecermos. Pai, dorme agora!
domingo, 10 de julho de 2016
A busca incessante
Pessoa certa; passo incerto como convém a
Quem seu desacerto se acerta na marcha; o
Tal que se inventa, que se inquieta; desperta
Sonhos e iras sãs de quem tem as dores por
Ser maior que a medida dos seus pés. E ama
Ama tanto, loucamente procura regaços p'ra
Seus cansaços e quimeras altas que o voam.
O ser assim gente que se enobrece apetece!
sexta-feira, 8 de julho de 2016
Entre nós
Faria hoje, sim faria hoje esse dia
Um dia acima de todos os outros
Um dia nosso da soma de muitos
De tantos, contas d'anos dum rio
Cheios dos defeitos, ainda assim
Muitos houve assim-assim, mais
Ainda todolos aqueles tão felizes
E tivemos filhos e envelhecemos.
Fomos, somos o Amor entre nós.
[Aos meus pais, dia do seu casamento]
quarta-feira, 6 de julho de 2016
O Pastor
Brandos braços brancos do moinho:
Volteiam pás vendavais ais d'agonia
São mundos que me trazem comigo
Ao sabor das ruas onde, campo alto
Ceara fruto oiro colhem de pessoas
A espiga e eu repouso do descanso
Que chama tresmalhados cansaços
À voz paternal do pastor poiso meu
Bordão. Entregue por fim meu sono.
terça-feira, 5 de julho de 2016
Haver
Supus tudo isto e mais ainda
E quando não dissemos nada
Soube, dum saber ante e p'ra
Além de mim, que irias morrer.
E fiquei a olhar-te antes e para
Além de ti a perceber que tudo
Tem por antecipação um nascer
E quando tropeçámos distraídos
Já cá não estás e os dias fingem
Que são aqueles dias antes deste
Casas de papelão a fazer de conta
Que há em nós continuação. Fadas
Pão-de-ló Os aniversários mentiras
Cristalizadas, frutos secos, amargos
Embalados, presentes dourados nas
Árvores de dezembros natais Poema
Onde cabemos na memória do nome:
Pai nosso que estais tão longe de nós
Vem buscar-nos Esta eternidade dura
Há tempo demais; pão ázimo teu beijo
Nos dais hoje assim na Terra haja Céu.
(c) Filipe M. | texto e imagem (2016)
segunda-feira, 4 de julho de 2016
Diário
Há um exacto momento em que nenhuma
Ideia de passado nem qualquer suposição
De futuro me traz presente. Inexistência!?
Não; um permanente excessivo contrário:
Algo cujos limites de início e fim desenha
Uma infindável planície, impreciso rumor
Sem zonas curvas como é suposto numa
Esfera. O calor estival produz esse sentir
Débil onde os corpos se exaltam Apogeu
Que convida à dança nua que se esvazia
E nos dá o mesmo preciso lugar. Estupor
Que aquieta e nos faz terroso miméticos
Não se cruzam ido e vindouro: presente
Estático, presente intacto, sem condição
De liberdade. A imagem treme imprecisa
Não me foco e sucessivas ondas perdem
Pé. Horizonte, horizonte azul descoberto
Nada é perto, o longe é para lá do braço
Onde só a mão desliga o dia a tempo do
Cigarro do copo do corpo do sexo febril.
O traço certo, exausto pede comutação.
Entro. Entro num lugar. Ah sombra solar!
sexta-feira, 1 de julho de 2016
(a)onde
Já lá vai algum tanto nenhum tempo
As mesas dos cafés têm os mesmos
Exactos sítios a saber de cor lugares
Que inventei anos depois da verdade
São agora tudo aquilo que eu quiser!
Já os posso olhar, são apenas tristes
Onde não tenciono voltar porque não
Posso o verso que calcinou os gestos
Que planavam no ar voos imaginários
Trazendo-me dum sítio onde ficasse!
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